ESTUDOS COMPARATISTAS DA LITERATURA
Corpo e Trabalho na Cultura Brasileira Contemporânea (Literatura e Cinema)
Docente Responsável: Ana Paula Pacheco
Considerando a ditadura militar brasileira como marco inaugural do tempo brasileiro contemporâneo (Paulo Arantes, O novo tempo do mundo), o o projeto investiga linhas de força do presente formalizadas em diferentes campos artísticos (cinema e romance). Partindo de adaptações para o cinema de romances modernistas feitas durante o período da ditadura, estuda-se, primeiramente, o fim do projeto moderno no campo artístico brasileiro, em relação com o fim do projeto de formação da sociedade e do país, no campo político. A seguir, a pesquisa se atém a obras específicas que marcam diversos momentos contemporâneos, da ditadura ao presente. Assim, propõe-se a investigação: 1) dos modos específicos de inserção de um conjunto de obras na dinâmica interna do processo cultural brasileiro, 2) dos modos de questionamento, pela cultura, de ideias reguladoras da “formação nacional” num quadro avançado de “mundialização” da arte, do capitalismo e seus modos de vida, em especial, do neoliberalismo entranhado na subjetividade. Obras centrais nesse percurso de pesquisa são: os filmes Terra em transe (1968), Iracema — uma transa amazônica (1974), Cabra marcado para morrer (1984), Os inquilinos (2009), Na vizinhança do tigre (2014), Branco sai, preto fica (2015), os romances Pessach: a travessia (1967), Em câmera lenta (1977), Três mulheres de três PPPês (1977), O nome do Bispo (1985), Cidade de Deus (1997), Pornopopeia (2009).
Deslocamentos, Descentramentos: Romances Sem Fronteiras
Docente Responsável: Sandra Guardini Vasconcelos, Jorge de Almeida
Apesar de instrumento importante nos diferentes processos de construção da nacionalidade e de identidade nacional, o romance nunca teve fronteiras e desde seu surgimento, por meio de transmigrações e transculturações, pôs em questão o que, nele, é nacional, e o que é estrangeiro; a evidência mais sintomática dessa porosidade certamente foram as intersecções, as mútuas apropriações e fertilizações que sempre caracterizaram o próprio modo de ser do gênero - híbrido, misturado e cosmopolita por excelência. A questão que nos toca é como pode uma forma literária gestada em um processo histórico específico - o da ascensão da burguesia e do capitalismo europeus - viajar e se enraizar em outras plagas? De que maneira acomoda o novo ambiente cultural? Como traduz uma nova realidade e conteúdos diferentes atravessando divisas linguísticas? De que modo se transforma graças aos novos usos e à nova situação em um novo tempo e lugar? O propósito comum que aproxima as vertentes desse projeto, portanto, é refletir sobre os sentidos desses deslocamentos e investigar suas sinergias, no processo de fundação e consolidação do romance e do sistema literário brasileiros. Utilizando o tema dos “deslocamentos” como ponto de partida, essa proposta tem como objetivo aproximar pesquisas nas subáreas da literatura mundial, da história do livro e teoria do gênero a fim de mapear o desenvolvimento do romance como um fenômeno que se desenvolve a partir das circunstâncias específicas da industrialização europeia, do capitalismo e do imperialismo, mas também como um gênero que resiste a essas meta-narrativas tanto em termos de seu apelo e leitorado transnacional. De modo geral, foi o romance o gênero literário que realizou essa operação, pois, ainda que importante instrumento nos diferentes processos de construção da nacionalidade e de identidade nacional, ele desde seu surgimento atravessou fronteiras reais e imaginárias e se revestiu de um caráter inter- e transnacional, na sua disseminação pelo mundo. Isso traz, portanto, para o âmago da discussão a necessidade de explorar as possibilidades dos deslocamentos e descentramentos, assim como a relação entre centro/centros, pensados a partir das coordenadas históricas que explicam as assimetrias e os desequilíbrios da ordem mundial.
Do Romantismo à Modernidade. Alguns Percursos
Docente Responsável: Marta Kawano
Busca-se uma reflexão a respeito da passagem do Romantismo à modernidade acompanhando uma série de questões a partir das obras de Gérard de Nerval e Charles Baudelaire (dois autores centrais do século XIX francês) e buscando a reverberação dessas questões na literatura do século XX. Um eixo importante que baliza esta interrogação, é a subjetividade, que irá aparecer, por exemplo, na relação entre narrativa e memória, que liga Nerval a Marcel Proust. Em Baudelaire, a atenção está voltada para a vinculação entre espaço (metrópole moderna versus espaços de recolhimento) pela qual se pode refletir sobre esse novo solo da poesia - moderno - a nova figuração subjetiva que ele engendra e suas consequências para o sujeito lírico -'moderno', em contraposição ao 'romântico'. Trata-se ainda de perceber como essa articulação sujeito-espaço se dará em alguns poetas do século XX. Outros autores, assim como outras questões, como aquela relativa à poesia e a reflexão, também estão no horizonte do projeto.
História e Alegoria no Fausto de Goethe
Docente Responsável: Marcus Vinicius Mazzari
Este projeto de pesquisa refere-se ao Fausto de Goethe, opus magnum da literatura alemã e também (em sua heterogeneidade “clássica”) uma obra das mais peculiares de toda a literatura mundial, uma vez que incorporou, ao longo das seis décadas de sua redação, traços pré-românticos do movimento “Tempestade e Ímpeto”, procedimentos simbólicos da estética classicista e, ainda, os recursos alegóricos do estilo de velhice. Pretende-se que dessa pesquisa resulte um estudo alicerçado nos mais proeminentes textos sobre a obra, que possa oferecer ao leitor brasileiro sínteses consistentes das principais posições teóricas na filologia fáustica, ressaltar os momentos de mudança de paradigma na fortuna crítica e construir também uma interpretação da tragédia (em particular do complexo dramático conhecido como “Tragédia da Colonização”) à luz de aspectos tomados ao processo colonizador brasileiro, o que pode significar uma contribuição até certo ponto inédita aos estudos goethianos. A pesquisa está centrada em três grandes eixos temáticos. O primeiro diz respeito à tradição “fáustica” anterior a Goethe, que se inicia em 1587 com a publicação do livro popular Historia von D. Johann Fausten. Sobre essa obra (de importância crucial para o Doutor Fausto, de Thomas Mann) há uma bibliografia imensa, a ser trabalhada de maneira seletiva, isto é, em consonância com os aspectos relevantes para o próprio Goethe. O segundo eixo da pesquisa está voltado prioritariamente ao substrato histórico da tragédia (camuflado com frequência sob a forma alegórica) e, por conseguinte, à sua surpreendente atualidade; abrir-se-á aqui amplo espaço ao papel desempenhado por Mefistófeles, certamente a figura demoníaca mais complexa, irreverente, “carnavalesca” (para usar esse termo central da teoria de Bakhtin) e, sobretudo, moderna de toda a literatura mundial. No terceiro bloco pretende-se contemplar as obras, na literatura posterior a Goethe, que desdobram motivos presentes no Fausto, avultando nomes como Dostoiévski, Fernando Pessoa, Paul Valéry, Mikhail Bulgákov, Thomas Mann ou ainda Guimarães Rosa.
História da Literatura Comparada no Brasil (Últimos 30 Anos)
Docente Responsável: Sandra Nitrini
Este projeto de pesquisa propõe-se a atualizar o panorama da Literatura Comparada no Brasil, a partir da análise dos programas de pós-graduação das universidades que sediaram a ABRALIC nos últimos trinta anos, do levantamento das linhas de pesquisa dos estudos comparatistas, acessadas nos sites dos referidos programas, da análise dos números da Revista Brasileira de Literatura Comparada e da apresentação das teorias comparatistas e dos conceitos literários que fundamentam as dissertações e teses de literatura comparada entre nós.
Narrativa e Crítica Latino-Americana Contemporânea (2000- Presente)
Docente Responsável: Marcos Natali
O projeto busca estudar a produção literária latino-americana dos últimos 20 anos, além de sua fortuna crítica e de textos teóricos que contribuam para a reflexão sobre o período e suas práticas culturais.
O Pathos na Literatura: Do Cântico dos Cânticos e dos Gregos à Literatura Contemporânea
Docente Responsável: Adelia Bezerra de Meneses
A proposta é uma abordagem da paixão na Literatura - da Bíblia e da Grécia até a atualidade. Mais do que conceituar, pretende-se ilustrar a experiência passional que os grandes textos registram, apontando uma série de paradigmas literários, num arco que se desdobrará do século IX a.C. até hoje: textos que nos ensinaram a dizer o amor. Serão assim levantadas uma série de características do amor-paixão, todas engendradas a partir da percepção da radical incompletude que perpassa nossa vivência pessoal (e que deu origem aos mitos do Andrógino n´O Banquete de Platão e de Eva tirada da costela de Adão, no Gênesis bíblico: mitos de cepas culturais diferentes, mas no entanto de mesma etiologia). Um primeiro rastreamento no elenco de textos da Literatura Ocidental, que tratam do amor-paixão, levaria a uma série de invariantes que, repertoriadas, apontariam a dívida ao paradigma do Cântico dos Cânticos. E aqui se confirma a formulação de Blake, retomada por Northrop Frye, de que a Bíblia é o Great Code da Literatura Ocidental - ao qual há que se acrescentar os gregos. O corpus da pesquisa integrará, além do Cântico, textos emblemáticos da paixão amorosa: de Safo, Píndaro, hinos homéricos, Eurípides, Sófocles, poesia trovadoresca; Tristão e Isolda, Dante, Petrarca, Camões, Shakespeare, Antero de Quental, Gonçalves Dias, etc - sempre num contraponto com os contemporâneos, Drummond, Guimarães Rosa, Bandeira, Neruda, Murilo Mendes, João Cabral, Ferreira Gullar, Adélia Prado, canção popular (MPB), quadrinhas folclóricas e cordel nordestino. É importante ainda dizer que tal busca de invariantes se equaciona, dialeticamente, com uma visada histórico-social, que buscará apreender as diferentes modulações que o pathos amoroso irá assumindo, ao longo da História.
Osman Lins: Professor, Leitor e Crítico da Literatura Brasileira
Docente Responsável: Sandra Nitrini
Este projeto tem duas vertentes. A primeira, concentrada no professor Osman Lins, parte do exame de todos os documentos relativos à sua atividade como docente no curso de Letras da antiga Faculdade de Filosofia de Marília, que constam de uma pasta, deixada por Julieta de Godoy Ladeira, e tem como objetivo organizar seus programas e esboços de aulas numa publicação comentada. A outra vertente, concentrada no leitor e crítico Osman Lins, contemplará análise de seus artigos sobre autores brasileiros, dentre os quais, destacam-se os dedicados a Lima Barreto, Graciliano Ramos , Clarice Lispector e Hermilo Borba Filho. A vertente do leitor e crítico concerne tanto a relação de Osman Lins com obras da literatura brasileira que, de uma certa maneira, ressoam na sua poética ou que são dadas como inerentes à tradição literária brasileira, quanto à leitura de seus contemporâneos. É como leitor de Machado de Assis que Osman Lins propõe a autores contemporâneos a reescrita do conto “Missa do Galo”. Nessa empreitada conjunta, que será objeto de estudo detalhado, algum elo se fortalece entre Osman Lins e escritores contemporâneos seus, alguns dos quais presentes em suas aulas como propostas de leituras aos alunos. As duas vertentes deste projeto se unem no propósito de se tentar compor o contexto das amplas relações literárias em que se movimentou Osman Lins, iluminar seu empenho para atuar em conjunto com seus colegas escritores e ressaltar sua militância na defesa da Literatura Brasileira, por meio de sua experiência como professor de Literatura Brasileira.
Um Estudo da Relação entre Lírica e Natureza Morta
Docente Responsável: Betina Bischof
A pesquisa tem por objetivo estudar a Lírica em comparação com outra modalidade de arte – a pintura, ou, num recorte mais específico, a pintura de Natureza Morta (em primeira instância, nos pintores dos Países Baixos no século XVII). O estudo, com base na história e na tradição pictórica e literária tem como objeto principal o debate acerca da gênese dessas duas modalidades. Tema fundamental será a constituição de um fechamento ou recuo (seja do eu lírico, seja dos objetos representados na pintura) a um lugar que se dá a apreender como espaço da interioridade. Assim, a partir da relação entre poesia e imagem, tema fundamental desde as discussões sobre a Ekphrasis antiga, buscaremos iluminar, no exercício comparativo, o corpus teórico-crítico sobre Lírica e sobre pintura, no recorte proposto. Detalhando um pouco mais, o estudo do assunto abordará dois pontos principais: a fratura entre sujeito e objeto na Lírica e na Natureza Morta; e a possibilidade de que se veja a apresentação fechada dos objetos de natureza morta no recinto burguês como uma espécie de eco do recuo do eu lírico em relação a um mundo hostil, que se imprime em negativo sobre a composição. O pressuposto que norteia a pesquisa é o de que, se esses dois pontos podem ajudar a pensar o contexto do surgimento da Lírica Moderna e da Pintura de Natureza Morta, eles parecem igualmente capazes de articular a reflexão em torno a alguns impasses da Lírica moderna e contemporânea, que será estudada a partir de um foco similar (unindo igualmente forma, expressão e história).
Por uma Ética das Formas
Docente Responsável: Roberto Zular
O presente projeto de pesquisa visa o estudo de questões teóricas suscitadas pelos escritos do poeta francês Paul Valéry (1871-1945), especialmente as relacionadas à história e à criação poética, tendo como objetivo principal a pesquisa do desdobramento dessas questões na recepção de sua obra entre poetas brasileiros (desde Mário de Andrade e Manuel Bandeira, passando por Drummond e João Cabral até os poetas concretos e Waly Salomão), sem prescindir da análise da vasta recepção do poeta em seu próprio País e na literatura hispano-americana.
Roberto Bolaño e a Metafísica da Violência
Docente Responsável: Marcos Natali
Se é comum, na fortuna crítica de Roberto Bolaño, a associação entre sua obra e a violência, com esta chegando até a ser identificada como princípio organizador de toda sua produção, este projeto propõe explorar essa intuição da crítica analisando o conteúdo ético e a estrutura narrativa de uma seleção de contos do autor. A ideia é testar a hipótese de que os relatos breves de Bolaño na verdade constroem um inventário de possíveis posições éticas diante da violência e do mal, um repertório que não parece justificar a conclusão de que o mundo é imune ao sujeito ético. Em vez de indiferença e impermeabilidade, análises detidas da matéria discursiva das narrativas de Bolaño encontram oscilação narrativa, complexidade enunciativa e instabilidade estrutural, abalando a ideia da violência como sentido geral e inescapável da história e da existência (mesmo quando o próprio relato inclui profecias generalizantes dessa ordem). Ao longo dos contos, o que se nota é a tensão recorrente entre um princípio sombrio, frequentemente reconhecido e anunciado explicitamente no texto, às vezes já no início da narrativa, e seus restos, isto é, tudo aquilo que excede ou interrompe o horror e às vezes o movimento do relato. Tendo como elemento comum a indagação daquilo que será chamado de "metafísica da violência", trata-se, portanto, de um trabalho de leitura comparada em três frentes: 1) uma seleção da obra narrativa breve de Bolaño; 2) sua crescente fortuna crítica; 3) a figuração da violência em certo arquivo filosófico contemporâneo (Derrida, Nancy, Agamben).